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segunda-feira, 13 de agosto de 2012

OS DOMINGOS PRECISAM DE FERIADOS


OS DOMINGOS PRECISAM DE FERIADOS

 (Rabino Nilton Bonder) 

 Toda sexta-feira à noite começa o Shabat para a tradição judaica. Shabat é o conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção, inspirado no descanso divino no sétimo dia da Criação. 
 Muito além de uma proposta trabalhista, entendemos a pausa como fundamental para a saúde de tudo o que é vivo. 
 A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a morte é pausa. Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue.
 Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente, onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga, onde nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo, descansar se torna uma necessidade do planeta. 
 Hoje, o tempo de "pausa" é preenchido por diversão e alienação. Lazer não é feito de descanso, mas de ocupações para não nos ocuparmos. A própria palavra entretenimento indica o desejo de não parar. E a incapacidade de parar é uma forma de depressão. 
O mundo está deprimido e a indústria do entretenimento cresce nessas condições. 
 Nossas cidades se parecem cada vez mais com a Disneylândia. Longas filas para aproveitar experiências pouco interativas. 
Fim de dia com gosto de vazio. Um divertido que não é nem bom nem ruim. Dia pronto para ser esquecido, não fossem as fotos e a memória de uma expectativa frustrada que ninguém revela para não dar o gostinho ao próximo... 
 Entramos no milênio num mundo que é um grande shopping. A internet e a televisão não dormem. 
Não há mais insônia solitária; solitário é quem dorme. 
As bolsas do Ocidente e do Oriente se revezam fazendo do ganhar e perder, das informações e dos rumores, atividade incessante. 
A CNN inventou um tempo linear que só pode parar no fim. Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo. 
Sem acostamento, a vida parece fluir mais rápida e eficiente, mas ao custo fóbico de uma paisagem que passa. 
O futuro é tão rápido que se confunde com o presente. As montanhas estão com olheiras, os rios precisam de um bom banho, as cidades de uma cochilada, o mar de umas férias, o domingo de um feriado... 
 Nossos namorados querem "ficar", trocando o "ser" pelo "estar". Saímos da escravidão do século XIX para o leasing do século XXI - um dia seremos nossos? 
 Quem tem tempo não é sério, quem não tem tempo é importante. Nunca fizemos tanto e realizamos tão pouco. 
Nunca tantos fizeram tanto por tão poucos... 
 Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é que é uma interrupção. O dia de não trabalhar não é o dia de se distrair literalmente, ficar desatento. É um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com sua vida. 
 A pergunta que as pessoas se fazem no descanso é: o que vamos fazer hoje? Já marcada pela ansiedade. 
E sonhamos com uma longevidade de 120 anos, quando não sabemos o que fazer numa tarde de domingo. Quem ganha tempo, por definição, perde. Quem mata tempo, fere-se mortalmente. 
É este o grande "radical livre" que envelhece nossa alegria 
- o sonho de fazer do tempo uma mercadoria. 
 Em tempos de novo milênio, vamos resgatar coisas que são milenares. A pausa é que traz a surpresa e não o que vem depois. A pausa é que dá sentido à caminhada.
 A prática espiritual deste milênio será viver as pausas. Não haverá maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou e quando algo vai começar. 
 Afinal, por que o Criador descansou? Talvez porque, mais difícil do que iniciar um processo do nada, seja dá-lo como concluído. 
 Autor: Rabino Nilton Bonder

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